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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

© 2014 Maya Blake

© 2015 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

O doce sabor da inocência, n.º 1628 - Agosto 2015

Título original: What the Greek Can’t Resist

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

I.S.B.N.: 978-84-687-7083-3

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S. L.

Sumário

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Epílogo

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

O estacionamento estava tranquilo, como esperara. Perla Lowell, dentro do Mini emprestado, procurou as palavras adequadas. Ao fim de duas horas, não passara das quatro linhas. Faltavam três dias para se dirigir aos amigos e familiares, e não sabia o que dizer. Na verdade, sabia o que dizer, mas não era verdade. Ninguém poderia saber a verdade. A sua vida, desde há três anos, fora uma mentira absoluta. Não podia estranhar que as mãos tremessem cada vez que queria escrever, nem que o coração acelerasse com as mentiras que tivera de contar, para manter as aparências. No entanto, o que podia fazer? Como podia humilhar-se, em troca de carinho? Se não dissesse o que esperavam que dissesse, a devastação seria insuportável. Rasgou o papel em mil pedaços, sentiu-se embargada pelas emoções que tentara conter durante tanto tempo que já nem se lembrava e as lágrimas amontoaram-se na garganta. Atirou os pedaços do papel pelo ar, tapou a cara com as mãos e esperou que, finalmente, conseguisse chorar.

Não chorou. As lágrimas teimavam em não brotar, como acontecia há duas semanas, como se quisessem castigá-la por se ter atrevido a esperar algo delas, quando sabia que chorar seria uma farsa pois, no fundo, se sentia aliviada, renovada. Deixou cair as mãos, lentamente, olhou pelo para-brisas e reparou no edifício georgiano que tinha à sua frente. McDonald Hall conservava o encanto de um clube exclusivo, com um campo de golfe que não se via por detrás da fachada imponente. Aquele clube centenário só permitia que o comum dos mortais entrasse lá das sete à meia-noite. Engoliu em seco e sentiu raiva por não se deixar levar. Por uma vez, podia ser normal e não teria de medir as palavras, quando estava a renegar o seu destino. No entanto, naturalmente, tinha um futuro pela frente. Pegou na mala, sentindo angústia. Estava tão longe, que não a reconheceriam. Afinal, conduzira durante mais de uma hora para encontrar um sítio onde pudesse acalmar-se e pensar naquilo que tinha de dizer. Efetivamente, a viagem fora estéril, até ao momento. Mas ainda não estava disposta a voltar e a encontrar expressões compassivas, e olhares atentos.

Voltou a fixar-se no McDonald Hall. Beberia alguma coisa e voltaria no dia seguinte. Abriu a mala, tirou a escova e tentou dominar o cabelo. Quando tocou no batom, quase o desprezou. O carmesim não era a sua cor preferida e tinha aquele batom porque lho tinham oferecido, quando comprara uns livros. Nunca se atreveria a usar algo tão descarado, embora o achasse muito sensual noutras mulheres. Abriu-o com dedos trémulos, olhou-se ao espelho retrovisor e pintou os lábios. A imagem voluptuosa refletida no espelho fez com que procurasse um lenço na mala, mas não o encontrou e voltou a olhar-se. O coração acelerou. Era assim tão horrível que, por uma noite, se sentisse alguém diferente de Perla Lowell? Era assim tão horrível que se esquecesse durante alguns minutos da dor e da humilhação que sofrera durante três anos?

Saiu do carro, antes de conseguir mudar de opinião. Talvez tivesse passado muito tempo desde que ia a festas. Mas sabia que o simples vestido preto, sem mangas, e os sapatos rasos eram adequados para o clube, onde ninguém a conhecia, numa terça-feira à noite. Além disso, se não fossem, o pior que podia acontecer era que lhe pedissem para se ir embora. E isso era uma insignificância, em comparação com a farsa monumental que vivera.

Um porteiro elegantemente vestido acompanhou-a por um corredor forrado de madeira, até chegarem a uma porta dupla com uma placa dourada, que indicava que era o bar. Outro homem, igualmente elegante, abriu-lhe a porta e levou a mão ao chapéu. Desorientada, reparou na decoração discreta, mas elegante, antes de lançar um olhar ao balcão comprido. O empregado preparava um coquetel, enquanto falava com um casal. Por uma fração de segundo, pensou em virar-se e ir-se embora, mas fez um esforço e foi até ao canto vazio do balcão. Respirou fundo, sentou-se num banco e deixou a mala em cima do balcão. O que estava a fazer?

– O que faz uma rapariga tão bonita como a menina, num lugar como este?

Aquela frase tão usada fez com que deixasse escapar uma gargalhada nervosa, antes de se virar.

– Assim está melhor. Por um segundo, pensei que alguém tinha morrido e não me tinham dito – o empregado olhou para ela, descaradamente, exibindo um sorriso arrebatador. – É a segunda pessoa que entra hoje aqui, como se viesse de um funeral.

Noutra vida, ter-lhe-ia parecido bonito e encantador mas, infelizmente, vivia nesta vida e aprendera, a um preço muito alto, que o exterior não costumava coincidir com o interior.

– Eu… Gostaria de beber alguma coisa – declarou, pondo as mãos em cima da mala.

– Claro – inclinou-se para a frente, com os olhos fixos na boca dela. – Qual é o seu veneno?

Não sabia. Da última vez que estivera num bar, a bebida de moda era o Amaretto Sour. Cerrou os dentes e voltou a pensar em ir-se embora, mas a teimosia fez com que ficasse onde estava. Já suportara o suficiente, já permitira durante muito tempo que alguém pedisse por ela e ditasse como tinha de viver. Isso acabara. Efetivamente, o batom carmesim fora uma má ideia e atraía muito a atenção para a sua boca, mas não ia permitir que esse ato de afirmação a aborrecesse. Endireitou-se e apontou para uma bebida vermelha, com muitas sombrinhas.

– Vou beber um destes.

– Martíni com sumo de romã? – perguntou, com o sobrolho franzido.

– Sim. Algum problema?

– É um pouco… Insípido.

– Tanto faz, vou beber um – replicou, com firmeza.

– Bom, permita-me…

– Sirva o que a senhora quer.

Uma voz grave e profunda soou por cima do seu ombro direito. Além disso, tinha um ligeiro sotaque estrangeiro, certamente mediterrânico, que fez com que tremesse.

O empregado empalideceu, antes de assentir com a cabeça e se afastar para ir preparar o coquetel.

Perla sentiu uma presença silenciosa atrás dela. Uma presença que a rodeava com uma força inconfundível. Sentia o perigo, mas não conseguia mexer-se, mesmo que quisesse.

– Vire-se! – ordenou ele, em voz baixa.

Ficou ainda mais rígida e agarrou na mala. Era apenas outro homem que queria submetê-la.

– Olhe, só quero que me deixem em paz…

– Vire-se, se não se importar.

Se não se importar… A frase, um pouco antiquada, fê-la sentir curiosidade. Isso, para além da voz grave e aveludada, quase a levou a fazer o que ele queria, embora continuasse a olhar em frente.

– Acabei de a salvar de ser a possível vítima de um descarado, que pensa que é um conquistador. O mínimo que pode fazer é virar-se e falar comigo.

Ela cerrou os dentes, apesar de o coração ter voltado a acelerar, por causa daquela voz.

– Não quero, nem preciso da sua ajuda. E não desejo falar com ninguém, portanto…

Olhou para o empregado com intenção de cancelar o que pedira. A viagem até ali, as palavras que esperara escrever, a ideia de beber alguma coisa, o batom carmesim… Tudo fora um desastre. Voltou a sentir a dor que lhe oprimia o peito e fez um esforço para dominar os seus sentimentos. O homem que se considerava o seu salvador continuava silencioso, imponente. Sabia que estava ali, porque conseguia sentir o seu cheiro viril. Voltou a sentir algo desconhecido na pele. Tinha uma vontade quase incontrolável de olhar por cima do ombro, mas já fizera muitas coisas mal e não ia fazer outra. Levantou a mão para tentar captar a atenção do empregado, mas ele só olhava para o homem que estava atrás dela e cuja presença, ainda que não soubesse quem era, nem o tivesse visto, irradiava uma força enorme.

Atónita, viu que o empregado assentia com a cabeça, dava a volta ao balcão com a sua bebida e se dirigia para um canto escuro. Indignada, virou-se finalmente e viu que o homem, muito alto, moreno, com uns ombros incrivelmente largos, também se afastava para a mesa onde tinham deixado a sua bebida, junto de outra. A fúria apropriou-se dela, levantou-se do banco e aproximou-se dele, antes de saber o que queria fazer.

– Posso saber quem pensa que é, para…?

Quando olhou para ela, ficou muda. Era impressionante… E tão incrivelmente real, que só conseguia olhar para ele fixamente, espantada. Enquanto tentava assimilar a pele bronzeada, as feições demolidoras, os reflexos grisalhos no cabelo e a barba incipiente, a sua verdadeira fraqueza, soube que não se devia ter virado, que devia ter dado ouvidos ao seu instinto e ter saído dali. Não aprendera com o seu erro?

Abanou levemente a cabeça e tentou recuar. Não devia estar ali, a olhar daquela maneira para um desconhecido. Se alguém descobrisse… Tinha de se ir embora!

Uns olhos cor de avelã observaram-na de cima a baixo. Susteve a respiração e voltou a agarrar a mala com todas as suas forças.

– É a sua cor verdadeira? – perguntou, olhando para o cabelo dela.

– Desculpe?

– Esse tom avermelhado é natural?

– Claro que é natural – afirmou, regressando um pouco à realidade. – Porque haveria de o pintar, se…?

Calou-se, ao perceber que não a conhecia e não podia saber que o que menos lhe importava era pintar o cabelo. Não tinha ninguém a quem agradar e estava demasiado ocupada a tentar sobreviver para pensar em frivolidades, como a cor do cabelo.

– Sim, é natural. Agora, vai explicar-me o que está a fazer? Apropriou-se da minha bebida.

– Tinha perdido as boas maneiras e estou a reconduzir a situação – e afastou uma cadeira da mesa. – Sente-se, por favor.

Ela arqueou a sobrancelha e ficou de pé. Ele encolheu os ombros e também ficou de pé.

– Não perdi as boas maneiras – replicou ela, soprando, revelando aborrecimento. – Intrometeu-se e tomou conta de uma situação que eu já tinha dominado. Acha que o empregado ia saltar do balcão para me atacar à frente dos clientes?

Parou de olhar para o cabelo dela e olhou-a nos olhos.

– Que clientes?

– Aquele casal que está…

Calou-se quando olhou à sua volta, pois verificou que o casal já se fora embora.

– É um sítio respeitável – continuou. – Essas coisas não acontecem aqui.

– Tem dados para dizer isso? Vem aqui muitas vezes?

– Não, claro que não – indicou, corando. – Também não sou ingénua. Eu… Só acho que…

– Os predadores com fatos feitos à medida são menos perigosos do que os que usam calças de ganga? – perguntou, exibindo um sorriso que não se refletiu no olhar.

– Não quis dizer isso. Vim apenas beber algo, tranquilamente.

Olhou para o seu coquetel vermelho, junto do licor escuro dele. Estava a perder o controlo e tinha de voltar a recuperá-lo antes de ter de explicar ainda mais coisas.

– Ainda pode bebê-lo – salientou ele, apontando para a cadeira. – Além disso, não tem de falar comigo. Podemos sentar-nos sem… Ter de falar.

Aquelas palavras fizeram-na sentir curiosidade. Ou talvez quisesse alguma coisa que a distraísse da dor e do caos que a esperavam, quando saísse dali. Tentou ver para além de tamanha beleza, dos ombros poderosos sob um fato impecável, de uma gravata de seda um pouco solta, do cabelo ligeiramente despenteado, como se tivesse passado a mão por ele várias vezes… Tinha rugas muito profundas junto da boca e o coração acelerou com aquilo que vislumbrou nos olhos dele. Soube que aquele homem não ia aproveitar-se de uma mulher vulnerável ou incauta. Isso não queria dizer que as mulheres estivessem a salvo da sensualidade que emanava dele mas, nessa noite, fosse quem fosse aquele homem, a dor que vislumbrara parecia-se tanto com a dela que sentiu dificuldade em respirar. Ele semicerrou os olhos, como se tivesse captado aquilo que estava a sentir. Ficou rígido e cerrou os dentes. Por um instante, pensou que ele ia voltar atrás, mas aproximou-se da cadeira e tocou-lhe nas costas.

– Sente-se, por favor.

Perla sentou-se, em silêncio, e ele deu-lhe o coquetel.

– Obrigada – murmurou.

Ele inclinou a cabeça e levantou o copo para brindar.

– Ao silêncio.

Ela brindou com uma sensação irreal, enquanto bebia e olhava para ele por cima do copo. O álcool queimou e esfriou a garganta, ao mesmo tempo. O sabor forte do sumo de romã fez com que fechasse os olhos com deleite, mas voltou a abri-los, ao aperceber-se do olhar penetrante dele. Mais uma vez, parecia fascinado com o seu cabelo e precisou de recorrer a todo o domínio que tinha sobre si própria para não tocar nele. Sorveu a bebida com força, pela palhinha. Por um lado, para acabar mais depressa e ir-se embora e, por outro, para fazer alguma coisa que não fosse olhar para aquele homem assustadoramente bonito.

Beberam em silêncio, até ela, invadida por um aborrecimento muito inquietante, deixar o copo vazio. O desconhecido fez o mesmo.

– Obrigada.

– Porquê?

– Por conter a vontade de falar de tolices sem sentido.

– Se quisesse falar, teria vindo com alguém ou teria chegado mais cedo, quando há mais gente. Suponho que escolheu esta hora pela mesma razão.

Uma sombra de dor atravessou o seu rosto, mas desapareceu imediatamente.

– Supõe bem.

– Não tem de me agradecer.

Limitou-se a olhar para o cabelo dela, outra vez. Mas, quando olhou para a sua boca, Perla não pôde evitar passar a língua pelo lábio inferior. E ele deixou escapar um som que a fez tremer. Nunca causara tal reação num homem e não sabia se devia sentir-se assustada ou agradada.

– Está alojado aqui, no McDonald Hall? – perguntou, para aliviar o mar de sensações.

– Sim, por umas noites – acedeu o desconhecido, cerrando o punho.

– Não sei porquê, mas tenho a sensação de que não quer estar aqui.

– Nem sempre podemos fazer o que queremos, mas tenho de ficar uns dias, mesmo que isso não me agrade.

– Então, vai passar do copo para uma garrafa, em breve? – replicou ela, olhando para o copo vazio.

– É bem possível que beber seja uma forma de fazer com que o tempo passe mais depressa.

Uma chama perigosa queimou-lhe as entranhas mas, mesmo assim, Perla não conseguiu mexer-se.

– Quando, perto da meia-noite, estamos sozinhos num bar, não vejo muitas mais coisas que possam distrair-nos – replicou ela, num tom tão rouco que não o reconheceu.

– Não estou sozinho – e arqueou uma sobrancelha. – Salvei uma rapariga em apuros e tenho a recompensa da sua companhia, neste momento.

– Não sou uma rapariga em apuros. Além disso, não me conhece. Poderia ser uma dessas predadoras que mencionou, senhor…

Ele não revelou o seu nome, embora lho tivesse perguntado descaradamente. E mostrou os copos vazios ao empregado do balcão.

– Penso que não devia beber outro…

– Estamos a conhecer-nos – interrompeu, olhando-a nos olhos. – Estava a falar-me sobre ser um predador desumano.

– Há dez minutos, queria estar sozinho. Lembra-se? Além disso, o que o faz pensar que quero conhecê-lo?

Ele esboçou um sorriso, entre seguro de si próprio e compassivo, que lhe pareceu ser uma combinação intrigante.

– Não sei e peço-lhe perdão por o ter presumido. Se quiser ir-se embora, esteja à vontade.

Mais uma vez, aquelas palavras amáveis e arrogantes tiraram-na do sério. Mas não podia deixar de olhar para aquele homem fascinante que, apesar da força que irradiava, transmitia uma dor e uma tristeza que a perturbavam. Passou a língua pelos lábios e arrependeu-se assim que ele fixou o olhar na sua boca.

– Não preciso que me dê permissão, mas… Beberei outro copo.

Efharisto!

O coração dela acelerou, devido à forma sensual como pronunciara essa palavra.

– O que quer dizer isso?

– Obrigado, em grego.

– É grego? Adoro a Grécia. Estive em Santorini há alguns anos, no casamento de um cliente. Na altura, pensei que um dia gostaria de casar lá. Isso eleva-o para um dos sítios mais bonitos da Terra e… – parou bruscamente, quando o rosto dele ficou tenso. – Lamento, estou a falar de tolices sem sentido.

– Não tem tão pouco sentido como tinha imaginado – e esboçou um sorriso. – Então, adora a Grécia. E que mais adora?

– É agora que devo dizer que adoro dar longos passeios à chuva, com alguém especial?

– Só se for verdade. Eu detesto chuva. Prefiro o sol e o mar.

– Esse alguém especial é opcional?

Voltou a captar aquela expressão entre dorida e de remorso mas, dessa vez, durou apenas um instante antes de encolher os ombros.

– Se tiveres a sorte de poder escolher e te agarrares a essa sorte…

Ela mordeu o lábio inferior e não pôde responder, porque o empregado trouxe as bebidas. Beberam em silêncio mas, dessa vez, quando olhou para ela, conseguiu não desviar o olhar. As têmporas grisalhas e a barba incipiente, perfeitamente cuidada, davam-lhe um aspeto imponente e irresistível que lhe acelerou o coração. Pareceu-lhe ser vagamente conhecido e acabou por decidir que o devia ter visto num jornal ou na televisão. O ar de poder confirmava essa teoria e, além disso, alojava-se no McDonald Hall, um dos clubes mais exclusivos do país.

Sem deixar de olhar para ela, levou o copo à boca. Uma onda ardente apropriou-se dela e chegou a recantos que achava que estavam congelados para sempre. Tentou convencer-se de que era por causa do álcool mas, sentindo raiva, obrigou-se a ver a verdade. Já não ia mentir mais a si mesma, para aliviar a dor. Nunca mais o faria! Aquele homem atraía-a. Sentia-se atraída pelo rosto impressionante, sulcado pela dor, pelos olhos cor de avelã, pelo queixo com barba incipiente, que parecia tão áspero como os dedos curtidos e viris. As imagens que surgiam na sua mente deveriam escandalizá-la mas, nessa noite, não ia escandalizar-se, nem envergonhar-se de nada. Além disso, desde quando era crime olhar, admirar?

– Tem cuidado, miúda. Este lobo grande e mau tem uns dentes muito afiados.

O aviso, dito com delicadeza, devolveu-a à realidade. O que estava a fazer? Pousou o copo precipitadamente, levantou-se e agarrou na mala.

– Eu… Tem razão. Normalmente, sou prudente. Obrigada pela bebida… E pela companhia.

Ele também se levantou e ela ficou com falta de ar, devido à sua estatura imponente.

– Veio de carro?

– Sim, mas não bebi quase nada do segundo copo e…

– O meu motorista vai levá-la a casa.

Um misto de medo e angústia apropriou-se dela, ao imaginar os falatórios, se voltasse para casa no carro de um desconhecido. Era quase meia-noite, mas bastaria que uma pessoa a visse para que o rumor se espalhasse.

– Não. É muito amável, mas não é necessário.

Theos

Ela decidiu imediatamente e assustou-se tanto que fez um esforço para não dizer nada. Voltou a acariciar-lhe os lábios sensuais. Segurou-lhe na mão e beijou-lhe os dedos. E então, lembrou-se de que tinha o telemóvel dele na outra mão e que bastaria um ligeiro movimento do polegar para que tudo acabasse. Também podia dar a resposta que precisava de dar e recuperar uma pequena porção de si própria, antes de ter de enfrentar o mundo.

– Nem sequer sei como te chamas.

– O meu nome é Arion. Se preferires, podes chamar-me Ari.

– Não. Prefiro chamar-te Arion – adorava mover os lábios para dizer o nome dele. – Arion.

– Gostas do meu nome? – perguntou, num tom rouco.

– Adoro o teu nome. Nunca o tinha ouvido. Arion…

Olhou para ela, como se quisesse ler os seus pensamentos mais íntimos.

– Essa forma de dizeres o meu nome… És perigosa, Pearl.

Ela não pôde reprimir mais a gargalhada que estivera a conter, devido à dor de existir.

– Perigosa? Isso é novo.

– O que te chamaram os outros homens?

A humilhação que conhecia tão bem ameaçou apoderar-se dela, mas reagiu com firmeza. Aquela era a sua noite e os pensamentos do passado não iam estragá-la.

– O que achas que me chamaram?

– Espantosa. Impressionante. Dotada de uma beleza que faria Afrodite empalidecer de inveja – sussurrou ele. – Tens um cabelo incrível, da cor do pôr do sol na Grécia.

Ela sentiu falta de ar e teve de pestanejar para conter as lágrimas.

– Aproximei-me da verdade? – continuou ele, acariciando-lhe a face com a barba incipiente.

– Nem pensar – declarou, derretendo por dentro. – Mas não deixes que isso te dissuada.

– Linda Pearl, quero ver o teu cabelo na minha almofada, quero perder-me nele…

Afastou-se um pouco para olhar para ele e, mais uma vez, viu a dor refletida no rosto dele, embora estivesse misturada com um desejo abrasador, inconfundível.

– Tens medo? – questionou Arion.

– Gostaria de responder que não, mas tenho um pouco de medo. Nunca tinha feito algo parecido, mas desejo-te muito – tanto, que nem conseguia pensar com clareza. A necessidade de esquecer aquilo que se aproximava era tão forte, que não conseguia respirar. – Desejo-te tanto, que não sei durante quanto tempo consigo resistir.

– Então, fica. Posso dar-te tudo aquilo que desejas – mas deteve-se, quando ia beijá-la outra vez. – A não ser que não sejas livre…

– O que queres dizer?

– Há um marido, outro homem?

Ela também ficou imóvel, devido aos remorsos. No entanto, era a sua noite. E o dia seguinte chegaria depressa.

– Sou livre, Arion. Ficarei contigo esta noite, se quiseres.

Provavelmente, a suíte era o cúmulo do luxo mas, com Arion a beijá-la, com os dedos dele no cabelo, com aquele corpo quente e duro apertado contra o dela, não pôde reparar em nada. Só percebeu que o botão que premira no elevador era o da suíte real. Reparou no sofá enorme, de veludo vermelho, onde a deixou assim que entraram na sala enorme, mas esqueceu-o assim que ele tirou o casaco e a gravata. Sentiu a boca seca enquanto ele desabotoava a camisa e uma onda de desejo percorreu-lhe o corpo, quando viu aquele peito musculado, cor de bronze, sem pelos. Aquela beleza impressionante fê-la sentir um desejo como nunca conhecera.

No entanto, não foi nada, em comparação com o que sentiu quando ele baixou as calças e tirou os boxers de algodão. A ereção era poderosa, orgulhosa… Enorme. E então, apercebeu-se da enormidade do que estava a fazer. Estava prestes a perder a virgindade com um desconhecido.